Por Ion de Andrade
Vamos saindo da quadra que foi marcada pelas maiores labaredas até agora acesas pelo nosso povo contra o regime de exceção que está no Poder.
Num acerto cosmético de preços com as empresas transportadoras e sem ferir o âmago da Política do Petróleo o governo teve sucesso (o Estado sempre ganha) em desmobilizar fortemente os caminhoneiros recorrendo inclusive a ameaças, processos e prisões. O Ministro Raul Jungmann foi quem mais sublinhou a carta da repressão nas suas aparições públicas, quando sempre e com ar de severidade, destacava os processos e prisões que viriam como lambadas nas costas dessa escravaria rebelada.
A greve dos petroleiros, por sua vez, foi afogada pelo TST que aumentou a multa diária aos sindicatos para dois milhões de reais. E, aos olhos do governo, de novo, la nave va. Só que não.
Vejamos:
1 A política entreguista dos derivados de petróleo do PSDB para a Petrobrás foi posta a nú. Hoje sabemos que o preço justo do diesel se situaria na casa de R$2,30 ainda assegurando 50% de lucros para a Petrobrás, caso esse diesel estivesse sendo refinado no Brasil. Esse levantamento feito pelo engenheiro Paulo Cesar Ribeiro Lima resultou nesse importante artigo “Mesmo que Petrobras tivesse margem de lucro de 50%, diesel poderia ser vendido a R$ 2,30”
2 A definição desse preço permitirá o estudo, já em andamento, sobre os custos para as famílias e empresas brasileiras dessa política para o petróleo do Governo Temer/Parente/PSDB. Aliás, considerando os 55 bilhões de litros de diesel consumidos por ano no Brasil, os 15 bilhões de litros de GLP, os 45 bilhões de litros de gasolina e os 26 bilhões de litros de etanol, logo chegaremos a em quanto o povo brasileiro foi lesado pelo senhores Parente (PSDB) e Temer. Se considerarmos um aumento linear de R$2,00 para os combustíveis teríamos já aí um total R$252 bilhões de reais por ano, aos quais deverão ser somados os cerca de 35 bilhões de reais de aumento do GLP, resultando em prejuízo na casa dos 287 bilhões de reais em um ano, tudo nas costas das famílias brasileiras.
3 Mas o prejuízo é ainda maior, pois,como foi fartamente divulgado, há uma fatura de importação de combustíveis dos Estados Unidos inteiramente desnecessária que numa ponta nos onerou com gastos em dólares e na outra com refinarias operando abaixo da sua capacidade. Ainda não sabemos em quantos bilhões de dólares fomos desnecessariamente onerados, mas logo saberemos.Tudo isso foi “DESCOBERTO” e agora há contas a serem prestadas à sociedade e, quando houver vergonha na cara, também à justiça.
4 No plano político o movimento dos caminhoneiros moveu-se vetorialmente contra os inimigos do Brasil e do seu povo e, apesar da sua despolitização e do foco excessivamente economicista, (centrado na sua própria dificuldade e com pouca clareza das razões que nos trouxeram até aqui e que representam os nós críticos que paralisam a economia brasileira: o golpe e a política do PSDB para a Petrobrás) a sua luta será lembrada como a primeira que fez tremer as estruturas do golpe. O posicionamento da Extrema direita de abandono dos caminhoneiros à própria sorte, que se exprimiu através de agressões ao movimento por jornalistas e âncoras de jornais televisivos, ou por pedidos de “volta ao trabalho” como o fez Bolsonaro, são oportunidades relevantes para que, no balanço que os caminhoneiros deverão fazer do seu movimento, possam galgar a um entendimento um pouco mais amplo de quem são os seus reais aliados, a começar pelos petroleiros que compartilharam com eles uma contemporaneidade e também estão comendo o pão que o diabo amassou. Creio que os sindicatos petroleiros devem buscar comunicação com esse valente movimento dos caminhoneiros para trocar ideias sobre as lutas e seus desdobramentos. Isso oportunizará um ganho considerável de maturidade para a intervenção política do nosso povo.
5 Se a extrema direita perdeu representatividade, se mostrando muito mais aliada do capital do que do trabalho, a esquerda teve relevante momento de lucidez. Muito cedo entendeu que não era a despolitização do movimento que deveria ser considerada, o que incluía demandas de volta da ditadura militar, mas o significado da peleja no enfrentamento do governo golpista e do imperialismo. O MST ofereceu alimentos aos caminhoneiros onde pôde e as lideranças mais expressivas da esquerda louvaram a firmeza, coragem e determinação desses trabalhadores. Herdeiros dos tropeiros que são, os caminhoneiros tecem uma rede gigantesca que amarra com laços de afeto a nossa nacionalidade e devemos discutir com eles também o Projeto de Brasil. Lembremo-nos que também Canudos queria, diante daquela República de sabres e baionetas, a volta da Monarquia, o que não nos impede hoje de entender que aquele movimento, messiânico e monarquista, foi uma das mais importantes páginas de heroísmo escritas pelo nosso povo. Essa relação de compreensão, entendimento e carinho pelo povo foi recuperada pela esquerda que viu cedo de que lado o movimento estava. Um ganho extraordinário na nossa formulação! O que abre para nós a missão pedagógica de permitir ao nosso povo a leitura correta da sua realidade política, como nos ensinou Paulo Freire.
6 O governo, por sua vez, perdeu muito em termos de bases sociais. O que ganha peso exponencialmente maior por estarmos num ano eleitoral. Importantes setores do empresariado entenderam que a política de preços do PSDB para a Petrobrás é incompatível com o papel que a empresa deve desempenhar no cenário da economia brasileira e a relevância estratégica de que permaneça pública. Isso resultará em dificuldades imensas para a obtenção de maiorias estratégicas no Senado ou na Câmara, assim como para formação, pela direita, de palanques viáveis nos Estados. A questão de estar a favor ou contra a Política do Petróleo do PSDB para o Brasil será, provavelmente um dos temas importantes da campanha. Aliás obcecado pela questão financeira e totalmente cego e insensível à gestão política, o que é prova de rematada e irremediável BURRICE, Pedro Parente ainda autorizou mais uma aumento da gasolina ontem… Esse desprezo pelo povo cobrará seu preço.
7 As Forças Armadas, por sua vez, continuaram fiéis a um comportamento republicano, o que merece relevo. Não atiçaram as demandas pela militarização do golpe, mas terão, frente à missão que têm de defender a Soberania Nacional, que ter posição sobre a Política de Petróleo do PSDB agora posta a nú.
No conjunto os diversos desdobramentos abertos pelos movimentos acentuam o isolamento do governo Michel Temer, e permitem, contrariamente ao que poderíamos imaginar, enxergar um esgarçamento da extrema direita e um fortalecimento do campo progressista, da democracia e da Soberania Nacional.
A eclosão do movimento mostra também que a paciência do povo chegou ao limite.
Parabéns aos caminhoneiros, aos petroleiros! É para frente que se anda!
ION DE ANDRADE